Tradução do texto original “The Four Noble Truths of Dhammic Socialism”, escrito por Santikaro Bhikkhu em 2002, excerto do livro “Entering The Realm of Reality: Towards Dhammic Societies”. Tradução feita integralmente pelo Blog Contra. Uso livre para copiar e distribuir. Acesse aqui o texto original.


As Quatro Nobres Verdades do Socialismo Dhâmmico

Santikaro Bhikkhu

Eu gostaria de começar essa abordagem com cada uma das quatro nobres verdades, já que elas são relevantes para a visão de uma Sociedade Dhâmmica. Para explorar a primeira “Nobre Verdade Social”, eu gostaria de revisar brevemente algumas das muitas formas de dukkha social. Ao longo desta discussão, nunca devemos esquecer que o que chamamos de “problemas sociais” não pode ser separado do que poderíamos chamar de “dukkha pessoal”. Há uma inter-relação entre dukkha que se manifesta em nós como indivíduos, que ajuda e co-cria os problemas coletivos de nossas sociedades, e, inversamente, como as estruturas da sociedade que manifestam esses problemas coletivos nos afetam de muitas maneiras, contribuindo assim para o dukkha pessoal ou interior que nos atormenta.

Um conjunto de problemas pode ser agrupado sob os princípios de moralidade, valores e cultura. Primariamente, é o consumismo que está varrendo o mundo. As pessoas já não mais confiam em sua própria sabedoria, cultura e experiência, em vez disso, procuram prazer e felicidade em coisas materiais produzidas e anunciadas pela cultura de consumo. Isto gera problemas como a quebra de comunidade. À medida que famílias individuais se concentram no seu próprio conforto e na aquisição de commodities, eles estão menos dispostos a investir tempo e esforço na manutenção dos laços e responsabilidades que nutrem e promovem a comunidade. Então, encontramos a divisão da comunidade vindo com a expansão da industrialização e do consumismo. A decadência não para por aí. Continua não apenas entre famílias, mas dentro das famílias sempre que o nível de individualidade se torna excessivo e obsessivo de tal forma que as pessoas já não tentam sequer sustentar os laços de família, ou o fazem apenas de maneira superficial. Além disso, os indivíduos da sociedade moderna, presos em sua hiperindividualidade, estão cada vez mais alienados de suas famílias e comunidades, até mesmo de seus próprios corpos.

A assunção arrogante de que nós podemos possuir e controlar a natureza nos alienou do mundo natural de onde nós viemos e do qual nós não poderemos nunca escapar. Esta alienação mental, emocional e espiritual deu origem a um grande número de problemas ambientais, como a poluição, mudança climática, a ausência de locais selvagens e intocados, superlotação, feiúra urbana e suburbana, desaparecimento de espécies e perda de biodiversidade. Relacionado a isso é a visão de mundo que só vê as coisas em termos de utilidade imediata ou valor material – e muitas vezes simplesmente como dinheiro – por exemplo, quando uma floresta é vista somente como pés de tábua ou dólares. Os seres humanos se tornam “consumidores”, isso é, são relevantes de acordo com seu poder de compra, que é a quantidade de lucro que pode ser explorada deles. Com esta desumanização, nós também estamos alienados espiritualmente, um tremendo problema que se mostra no colapso da religião e da moralidade hoje, inclusive dentro do budismo.

  Os problemas relacionados são a incapacidade da educação para incutir valores humanos, morais e religiosos; o lixo impensado, muitas vezes violento, desprovido de qualquer valor humano que inunda os canais de televisão e vias aéreas; a falta de transparência, honestidade, responsabilidade e liderança na política; as pessoas que ganham grandes quantidades de dinheiro nos mercados financeiros, sem produzir nada para o benefício da humanidade, ao mesmo tempo que sugam recursos enormes através de especulação sobre ações, futuros, títulos, preços de commodities e outras formas do chamado investimento; o genocídio de povos indígenas em todos os lugares; injustiça de gênero; e muito mais.

Estruturas do egoísmo

Eu acredito que os profundos e detalhados ensinamentos budistas sobre o eu (atta), corrupção (kilesa), apego (upadana), e outras causas de dukkha são uma ferramenta que a humanidade deve usar para sair desta bagunça. Uma perspectiva simples a partir da qual examinamos as causas e origens da dukkha social é o egoísmo. Quando analisamos nossa dukkha pessoal usando o princípio de originação dependente (pattica-samuppada), vemos que tudo isso está ligado ao nosso egocentrismo ou egoísmo. Da mesma forma, quando examinamos problemas sociais, descobrimos que eles são enraizados no egoísmo social, o que eu chamo de “estruturas de egoísmo”. Aqui, egoísmo significa uma preocupação por si mesmo, sua própria família ou seu próprio grupo (companhia, classe, religião, raça, nacionalidade, clube esportivo) acima de tudo, de tal forma que se desconsidera as necessidades e o bem-estar dos outros, ou mesmo chega ao ponto de prejudicar conscientemente os outros quando o egoísmo está fora de controle. Na análise Budista, tal egoísmo surge de tanha (desejo/sede/ânsia) e upadana (apego a este desejo), que há um “eu” ou “alma” que deseja, isso dá origem às identificações e estados mentais egoístas em torno dos quais nosso egoísmo se forma. Este “nexo causal” não acontece apenas pessoalmente, também acontece coletivamente à medida que certas formas de desejo se tornam endêmicas em nossa sociedade. Certas formas de apego estão incorporadas em nossas estruturas sociais. Nós temos certas identidades coletivas à cor da pele, linguagem, religião, história, ideologia e assim por diante. Nós formamos egos coletivos e somos coletivamente egoístas, o que é as vezes chamado de “interesse nacional” (ou “interesse de classe” ou qualquer “interesse”). Estes dão origem a “estruturas de egoísmo”, algumas das quais eu gostaria de explorar aqui.

Um equivalente aproximado da palavra “egoísmo” é o termo em Pali kilesa (mácula/corrupção/veneno/obscurecimento, aquilo que mancha ou polui a mente). Portanto, podemos pegar as impurezas primárias que investigamos e se desenraizar na prática budista e usá-los para investigas certas estruturas sociais. Isso nos dá uma ferramenta analítica simples, mas poderosa, baseada na moralidade e na espiritualidade.

  • Cobiça (lobha): Capitalismo e Consumismo
  • Raiva (kodha): Militarismo e Injustiça
  • Ódio (dosa): Racismo, Classismo e Exclusivismo
  • Luxúria (raga): Prostituição no Entretenimento, Turismo e Negócios
  • Delusão (moha): Educação e Mídia
  • Competição: Capitalismo, Esportes e Um Modo de Vida
  • Medo (bhaya): Medicina e Religião
  • Sexismo: Todos os tipos de Kilesa

Ignorância: A Causa Última

Para tornar esta análise um pouco mais profunda, nós devemos investigar o que o budismo considera ser a causa última de dukkha. Talvez isso também seja a causa última de nosso dukkha coletivo e social? A causa básica de todas essas estruturas de kilesa é a ignorância: não ver as coisas como elas realmente são.

Nos dias de hoje, uma das formas mais comuns de ignorância pode ser chamada de “pseudociência” ou “cientificismo”, uma ilusão de investigação da realidade das coisas que ignora partes importantes da realidade. Por exemplo, pseudociência é reducionista; ela quebra as coisas em partes e assume que essas coisas não são nadas além da soma destas partes, ignorando a natureza holística e integrada das coisas. Pseudociência é obcecada com fenômenos materiais e causas materiais, logo ignorando os fenômenos mentais, éticos, espirituais e baseados em valores nas causas dos problemas sociais. Mais além, a tendência mecanicista da pseudociência; a fé cega no progresso, evolução e desenvolvimento positivo; a assunção que o observador é separado do observado, então objetificando e subjetivizando a realidade; todos esses fatores se combinaram para transformar a ciência em pseudociência.

Socialismo Dhâmmico e o Fim de Dukkha

Ajarn Buddhadasa chamou sua visão da sociedade nibbanica de “Socialismo Dhâmmico”. Para ele, o Socialismo Dhâmmico expressava dois fatos básicos. Um é de que nós somos inevitavelmente e inescapavelmente seres sociais que devem viver juntos em uma forma de sociedade que dá prioridade para os modos em que nós nos inter-relacionamos, trabalhamos juntos e ajudamos uns aos outros a resolver os problemas e dukkha da vida. Logo, os princípios de relacionamento correto e inter-relação correta são o coração de tal sociedade. Tan Ajarn entendeu tal forma de sociedade como sendo o significado de Socialismo, o que pode diferenciar do entendimento de cientistas políticos e de Marxistas.

O segundo fato é de que o Socialismo pode dar errado. Houve várias abordagens ao Socialismo e algumas delas estavam incorretas, isto é, autoritário, violento e corrupto. Ajarn Buddhadasa insiste que o Socialismo deve ser modificado pelo Dhamma para se manter honesto, moral e não-violento. Então, nós falamos de Socialismo Dhâmmico. Nós não queremos um socialismo que seja primariamente materialista ou econômico. Ele não defendeu um socialismo baseado no conflito de classes ou em vingança de classe. Em vez disso, nós procuramos um Socialismo em harmonia com o Dhamma. Estar em harmonia com o Dhamma significa que é baseado na percepção da interdependência humana.

Em outras palavras, nosso Socialismo deve ser moral, enraizado em siladhamma (moralidade). Siladdhama consiste em relacionamentos e atividades que não oprimem ou tomam vantagem de ninguém, nem mesmo de si mesmo, e que são para o benefício mútuo de nós mesmos, outros e o coletivo. Como nós vimos anteriormente, opressão social é enraizada em kilesa estrutural e pessoal, isto é, egoísmo. Eliminando tal egoísmo é a tarefa de siladhamma, religião e Socialismo Dhâmmico. Se o nosso socialismo pode ir além do nível moral e alcançar uma sociedade em que todos estão livres não apenas de comportamento egoísta, mas também de pensamento egoísta, não precisa ser discutido aqui. Eu acho que é o suficiente, por agora, focarmo-nos numa sociedade em que o comportamento egoísta seja minimizado. No entanto, como discutiremos mais tarde, deve ser dada importância a uma moralidade mais profunda que diminua o egoísmo e uma espiritualidade que elimine o egoísmo, se as pessoas quiserem controlar e transformam seu comportamento pelo bem da Sociedade Dhâmmica. As pessoas necessitam uma visão que mostre como a verdadeira felicidade reside no Socialismo Dhâmmico e numa sociedade nibbânica, e não no egoísmo, consumismo, materialismo e assim por diante.

Estruturas Sociais Dhâmmicas

Então como é a sociedade quando as estruturas egoístas corrompidas são removidas? O que serão as estruturas compostas de valores e virtudes honradas pelos budistas e outras religiões? Por um lado, quando a estrutura gananciosa do capitalismo for removida, estrutura econômica será de dana (generosidade, partilha), santutthi (contentamento com o que se tem), caga (sacrifício, liberalidade), mattannuta (moderação, suficiência) e autossuficiência. Apenas isso já seria uma mudança radical em relação a sociedade atual, embora as culturas passadas tenham chegado perto, especialmente em áreas rurais e entre os povos indígenas. Nas sociedades tradicionais, generosidade e partilha são muito importantes, unindo os membros da comunidade em boa vontade mútua. O contentamento com o que a natureza e a vida proporcionam é muito mais saudável do que a fome sem fim, para nós bem como para o ecossistema. Por último, ao praticar o modo de vida correto (samma-ajiva), as pessoas atenderão às suas necessidades de maneiras não destrutivas, não exploratórias e sustentáveis.

No lugar de raiva e militarismo, a sociedade será baseada em metta (amor bondade) e karuna (compaixão). Na maioria das escolas do budismo, nós encontramos lendas do Buda Maitreya, o Buda que virá, que inaugurará uma era de amor e compaixão universais. Outras tradições têm crenças e imagens parecidas, por exemplo, a segunda vinda de Cristo. Enquanto muitas pessoas hoje em dia rirão de tal ideal, o Socialismo Dhâmmico conterá estruturas que consagrarão os valores de metta, karuna, simpatia e empatia.

Em vez de estruturas competitivas, a sociedade existirá através de samaggi (harmonia, unidade), cooperação e suporte mútuo. Irão existir muitas formas de grupos, organizações e comunidades onde as pessoas compartilharão conhecimento, habilidades, recursos e experiências. Isso não será um tipo de ajuda na mesma moeda. Em vez disso, samaggi, nos inspirará a ajuda espontaneamente; sempre que alguém precisar outras pessoas estarão lá. Isso não é desconhecido no mundo; ainda existem muitas comunidades no mundo onde chamam e a ajuda chega.

No lugar de sistemas de ódio como o racismo, classismo, sectarismo religioso e outras formas de exclusivismo, terá respeito (garava) e apreciação (anumondana) para diferenças e diversidades em idade, gênero, raça e etnicidade, religião, idioma, passados, talentos, forças e por aí vai. As tentativas de impor conformidade cessarão e as diferenças não serão utilizadas para fomentar o medo e o ódio. Serão entendidos como recursos e motivos de alegria; nós saberemos como aprender com eles. A necessidade de formar grupos de identidade e grupos de ego desaparecerão. Ao menos, se algum nível de identidade permanecer não irá mais ser exclusiva, irá ser aberta ao diálogo e parcerias criativas com outros grupos.

Sexualidade saudável em famílias saudáveis substituirá sexismo, a estrutura doente do medo, ódio e luxúria. Assim, as crianças serão criadas e socializadas sem todos os medos, obsessões, supressões e prejuízos do patriarcado e sexismo. Aqui, a família saudável significa que um marido e uma mulher* têm um amor maduro baseado em respeito e responsabilidade compartilhada, o necessário e correto para sexo. Cada casal terá apenas a quantidade de crianças que eles podem dar tempo adequado, energia e amor. As pessoas farão algum trabalho espiritual em si mesmas antes de se engajar nessa importante tarefa que é a reprodução. Certos papéis podem tender a ser da alçada de um sexo ou outro, mas nunca de forma exclusiva ou rígida. Os homens serão capazes de apreciar e desenvolver suas qualidades femininas; mulheres serão capazes de apreciar e nutrir suas próprias qualidades masculinas.

A Sociedade Dhâmmica encorajará muitos de seus cidadãos a nekkhama, renunciação ou afastamento da sensualidade. Não apenas ascetas e celibatários, mas estudantes, adultos maduros e pessoas de todos os setores da vida serão apoiados a viver uma vida baseada em formas mais refinadas de felicidade, isso é, o tipo não-sensual. Até mesmo pessoas casadas serão ajudadas a passar partes significantes de seus anos reprodutivos desfrutando a liberdade da escravidão sensual. Isso não é tão improvável quando o consumismo for conquistado e as pessoas não forem mais fustigadas por estruturas de raiva, ódio e medo.

Essa é des-educação e estruturas de ilusão dos meios de comunicação de massa serão transformadas em estruturas de consciência, conhecimento e vitalidade cultural. Uma variedade de atividades possibilitantes e recursos ajudarão a proporcionar as pessoas a conhecer e entender a si mesmas, outras, sociedade, natureza e Dhamma. Essas atividades talvez não venham em formas tradicionais das escolas e universidades, embora tais instituições ainda possam existir. Educação será vista como um processo que leva a vida inteira; em vez de só conseguir um diploma e fazer dinheiro, será orientada para o fim de dukkha. O foco será em entender o que realmente é importante na vida e na sociedade humana, para habilitar a cada pessoa achar seu lugar e papel na sociedade, para aproveitar esse lugar e papel sem nenhuma decepção ou “transe de consenso”, e de se empenhar para este papel ou responsabilidade para o melhoramento da sociedade. Mais importante, a educação estará na mão da comunidade onde ocorre e envolverá parcerias entre alunos e facilitadores.

Similarmente, a mídia servirá a função de troca de informações genuinamente úteis. Enquanto ainda existirão coisas como internet, televisão e algumas formas de jornal, eles não mais estarão sob o controle do patriarcado, capitalismo e militarismo. Eles não mais estarão sob o controle de vastas burocracias impessoais, sejam estatais, corporativas ou religiosas. Liberta de tais estruturas, a mídia será utilizada criativamente para permitir as pessoas a encontrar coisas que realmente as beneficiam. A mídia então será parte do processo de educação Dhâmmico, ajudando as pessoas a continuarem aprendendo ao longo da vida. Em vez de informações serem alimentadas a nós em um fluxo unidirecional, os sistemas de informação Dhâmmicos serão verdadeiramente interativos. O aluno será capaz de controlar conteúdo, ritmo, etilo, etc. Além disso, a mídia ajudará as pessoas vivas a trocar seus conhecimentos e experiências.

As estruturas de medo que criaram as indústrias das doenças e dos seguros serão transformados em sistemas que ajudam as pessoas a compreender a vida e a morte, a adaptar-se às mudanças e doenças e a conviver com a dor. Com tal compreensão, as pessoas não terão medo das mudanças corporais, ainda que terá uma séria de estratégias para ajudar a evitar dor desnecessária, morte prematura desnecessária, confusão e assim por diante. Tal sistema centrar-se-á na saúde e não na doença. Se entendermos a vida, sociedade, natureza e Dhamma nós saberemos o que é saúde. O sistema médico será um sistema de saúde que cobre todos os aspectos da vida e deixa de ser uma “indústria”. O seguro será adquirido por meio de uma boa dieta, condições sãs de vida e de trabalho, exercícios e Dhamma. Drogas e intervenções tecnológicas terão apenas um papel de apoio.

Similarmente, religiões genuínas – que já existem por lá e por cá – estarão na linha de frente. Não será necessário instituições elaboradas, ricas e poderosas, pois viverá no coração das pessoas, em seus valores e relacionamentos. Irá ajudar e aconselhar as outras estruturas bodhi (despertas ou despertando), não mais sugando das estruturas kilesa ou tentando dominar a sociedade. Sua única preocupação será as diversas expressões de espiritualidade e moralidade.

Por último, os sistemas competitivos serão substituídos com sistemas cooperativos. As velhas comunidades autossuficientes retornarão, muitas vezes em novas formas. Formas criativas de organização permitirão cooperação por meio de responsabilidade mútua, respeito, participação e consenso. Por exemplo, o sistema da Sangha de Buddha assumirá uma nova vida de diversas maneiras, adaptando-se às condições locais. Sem política adversária, não precisaremos de partidos políticos. O governo será descentralizado, de baixo para cima, transparente, não-hierárquico e baseado no princípio de Schumacher da subsidiariedade que diz que “nada deve ser feito centralmente se puder ser feito igualmente bem, ou melhor, localmente”.

Resumidamente, o Socialismo Dhâmmico é uma sociedade não mais baseada em egoísmo. Sua fundação é a compreensão-consciência de nossa interdependência e a necessidade de trabalharmos juntos, cuidarmos uns dos outros, fazermos sacrifícios, abrir mão do eu e desistir de interesses egoístas pelo bem da sociedade, para o bem-estar do planeta e pelo bem do Dhamma. Socialismo Dhâmmico é a visão para uma sociedade não-egoísta, uma que é nibbânica ou tranquila. Por causa dos preconceitos da teoria social moderna, voltando para Hobbes e Locke, essas idéias podem parecer absurdas ou impossíveis de serem para muitas pessoas que foram criadas assumindo que a vida e a sociedade são cruéis competições. No entanto, budistas tem fé na Natureza Búdica e tomam isso como o princípio que guia a sociedade. Todos nós somos Buddha. Todos nós somos capazes de acordar para a nossa verdadeira naturezas através o caminho de mindfullness, compaixão e sabedoria. Fundamentalmente, nós estamos bem. Nós devemos condenar o entendimento errado embutido nas teorias sociais e políticas que assumem o pior dos seres humanos, porque elas se tornam profecias autorrealizáveis. Em vez disso, precisamos articular possibilidades de mente aberta, flexíveis e não sectárias para uma sociedade altruístas, ou, se preferir, Socialismo Dhâmmico.

O Nobre Caminho Social Duodécuplo

Resta uma última nobre verdade a abordar aqui: o caminho que estamos seguindo para concretizar a sociedade não-egoísta. Cada aspecto das quatro nobres verdades são necessários na resolução de problemas. À medida que aprofundamos nossa compreensão de onde viemos, os problemas e suas causas, e para onde estamos indo – isto é, a sociedade nibbânica – nós devemos encontrar modos práticos e eficazes de começar e sustentar nosso progresso. Como sempre em nossa prática, trabalhamos no presente momento. Isso não significa ignorar o passado e o futuro, apenas que lidamos com a realidade aqui e agora como ela é. Então, como chegamos lá a partir daqui?

A palavra-chave acompanhando todo fator do caminho é “certo” ou “correto” (samma). A correção não deve ser definida em termos dogmáticos. Nada é correto, senão a graça do Dhamma, isto é, quando está em harmonia com a lei natural e apropriado às causas, propósito, tempo, sociedade, indivíduos envolvidos e si mesmo. Assim, o significado de “certo” ou “correto” depende das causas e condições de cada caso. Nós devemos ser atentos, sensíveis, mente aberta, flexíveis, criativos e perspicaz para acompanhar e responder às diversas circunstâncias em mudança.

A nobreza de nosso caminho também é crucial. É claro que não queremos dizer “nobre” (ariya) na forma hierárquica ou classista comum. Literalmente, a palavra Pali significa “ir (ya) longe de seu inimigo (ari)”. Tradicionalmente, “inimigo” refere-se a kilesa. Acima, deixamos claro que as estruturas sociais kilesa são inimigas de todos os seres. Além disso, o caminho é nobre apenas porque meios nobres e hábeis são usados. Por exemplo, nós evitamos a violência. Pensemos cuidadosamente nos “meios nobres”.

  • Religiosidade Correta
  • Educação Correta
  • Liderança Correta
  • Organização e Governo Corretos
  • Cultura Correta
  • Sexualidade e Família Corretos
  • Economia Correta
  • Ecologia Correta
  • Diversão Correta
  • Monitoramento Correto
  • Sangha e Solidariedade Corretos

Ajarn Buddhadasa frequentemente enfatizou que o Nobre Caminho Óctuplo por si só não é o suficiente. Os oito fatores são apenas o conjunto de causas; nós não terminamos até que surja o conjunto de frutos. Assim, ele nos lembrou de considerar seriamente os dez fatores corretos (sammatta). Embora o Buddha tenha ensinado muitas vezes os dez fatores corretos o Tipitaka, a tradição Theravada ignorou amplamente os últimos dois fatores. Uma vez em que o caminho é completamente e corretamente desenvolvido, surgirá o insight de sabedoria correto (samma-nana) e libertação correta (samma-vimutti). O insight de sabedoria correto significa que conhecemos as verdades e segredos fundamentais para vivermos juntos em harmonia. A libertação correta é a Sociedade Dhâmmica que é livre de egoísmo e das estruturas sociais egoístas, da opressão, alienação e de dukkha. Em última análise, a correção de nosso caminho budista engajado será sua habilidade de trazer o insight correto e a libertação correta.


Notas:

*: Ou dois maridos, duas mulheres ou nenhum dos dois.

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